O Quartel Velho dos Bombeiros foi o local escolhido para acolher o Presépio Tradicional Português em Santiago do Cacém. A iniciativa é inaugurada a 7 de Dezembro, às 21h30, e prolonga-se até 7 de Janeiro. Ao longo deste mês, terão lugar conferências, visitas guiadas, concertos e outras iniciativas que visam dar a conhecer as boas práticas da arte dos Presépios.
Quando se aproxima o Natal, a magia do Presépio renasce. No entanto, a arte do Presépio Tradicional Português está a definhar e corre o risco de se extinguir. O alerta é dado pelo Centro UNESCO de Arquitectura e Arte (UCART), com sede no Alentejo.
De acordo com quem analisa o fenómeno da descaracterização dos presépios, este problema não reside, na concorrência do Pai Natal ou das árvores cheias de bolas coloridas que fazem parte do imaginário mais recente da quadra. O que tem vindo a suceder realmente, nas últimas décadas, é uma perda acentuada dos traços distintivos dos nossos presépios, que abandonam a sua matriz e se tornam cada vez mais produtos comerciais descartáveis. Está em risco um património, material e imaterial, que precisa de mais atenção.
“O Presépio Português faz parte de uma rica tradição europeia, mas tem personalidade própria, em que marcam presença as cenografias baseadas em paisagens naturais, a multiplicação de cenas da vida rural e urbana, a alternância de escalas e o destaque conferido à Sagrada Família, que é o seu epicentro”, salienta José António Falcão, responsável do UCART. E acrescenta: “Não se trata de manter a arte presepística como algo parado no tempo, há todo um espaço de inovação a valorizar, mas o que ocorre agora é uma amálgama de coisas sem sentido e sem gosto, que perturba inclusivamente a captação da mensagem de fundo do Presépio”.
Assegurar o futuro desta arte, transmitir os seus preceitos aos mais novos e adaptá-la aos tempos de hoje são as chaves de uma iniciativa que transforma a construção de um Presépio Tradicional Português numa “escola viva” do Presepismo e chama si a intervenção dos moradores no centro histórico de Santiago do Cacém. O local escolhido é um edifício emblemático da cidade: o Antigo Quartel dos Bombeiros, projectado pelo arquitecto Rafael de Castro, em 1931, onde existira a capela de Santo António.
Um Presépio comunitário que recupera velhas práticas
Sob a orientação do arquitecto Ricardo Pereira, da conservadora-restauradora Sara Fonseca e da pintora Raquel Ventura, mais de meia centena de pessoas, entre adultos e crianças, trabalharam afincadamente, ao longo de vários dias, na construção do Presépio. Na retaguarda, o escultor Vasco Tavares da Silva, o mestre serralheiro Gonçalo Cavalinhos e a professora aposentada Ivone Pereira Bento foram velando para que tudo avançasse da melhor maneira.
De início, uma equipa recolheu pedaços de cortiça, troncos, bolotas e ervas aromáticas nas matas litorais, tendo o cuidado de preservar espécies protegidas; outra concebeu a estrutura de base, ergueu a sua “alma”, usando cadeiras e mesas, e forrou-a com papéis coloridos, fabricados por uma empresa da zona; outra foi desembrulhando e alinhando centenas de figuras – todas com mais de 50 anos, todas feitas em materiais tradicionais –, emprestadas por famílias e instituições da terra; outra ainda ocupou-se de alguns restauros imprescindíveis.
A montagem do presépio, foi um acto comunitário a que todos deram uma nota pessoal, à semelhança de outros tempos, o Presépio foi ganhando corpo, permitindo explicar não só como o montavam os nossos antepassados, mas também o que simboliza cada um dos seus elementos. Uma “escola informal” da arte presepística, em que se transmitem, de geração para geração, os segredos de como se faz uma gruta, se monta uma cascata ou se dispõe a cavalgada dos Reis Magos.
O antigo bombeiro, Alfredo Sobral, carpinteiro reformado e bombeiro honorário da Corporação local, em que ingressou com 17 anos, não ocultava a sua satisfação por ver de novo o edifício de portas abertas. “Gosto de ver assim este espaço, cheio de gente nova; no meu tempo, foi uma escola de vida”. Natália Caeiro, a presidente da Associação de Bombeiros Mistos, refere: “É uma honra que o Centro UNESCO tenha escolhido o nosso quartel velho para as suas actividades, queremos todos dar um contributo para a revalorização do Presépio Português”.
Fonte: Terras sem Sombra