O Governo ainda não anunciou a localização do terminal de contentores da região de Lisboa, no entanto, à medida que a opção por Setúbal perde força, o Barreiro está, aparentemente, mais próximo de fazer o xeque-mate final.
O secretário de Estado dos Transportes, Sérgio Silva Monteiro, durante a sessão de abertura da conferência “Porto de Setúbal – A Resposta Imediata – uma estratégia portuária coerente”, reconheceu que o Porto de Setúbal tem um “imenso potencial”, reiterando, no entanto, que atualmente “não há investidores interessados” em instalarem-se em Setúbal.
O governante defendeu que o futuro porto de águas profundas que vai aumentar, amplamente, a capacidade instalada no Estuário do Tejo, “não deve ser visto numa perspetiva exclusiva – Setúbal ou Barreiro -, mas numa perspetiva inclusiva – Barreiro e Setúbal”.
“A presidente da administração do Porto de Lisboa admitiu que há vários investidores interessados no futuro terminal de contentores no Barreiro, vamos dizer-lhes que não porquê?, que prejuízo tem Setúbal com a instalação de um novo operador no Estuário do Tejo?”, questionou Sérgio Monteiro, acrescentando que cabe ao Governo “estudar, ouvir os agentes económicos e, posteriormente, tomar uma decisão” e não “proibir que o investimento seja feito num determinado local e obrigar os investidores a instalarem-se em Setúbal”.
Prolongar no tempo a discussão sobre a localização do futuro porto de águas profundas pode, para o secretário de Estado dos Transportes, implicar a “perda de oportunidade” e um atraso do desenvolvimento da atividade portuária nacional em relação aos outros estados-membros da União Europeia, nomeadamente a Espanha e, nesse caso, “perde Setúbal, perde a margem sul do Tejo, perde a Margem norte do Tejo e perde Portugal”. “Espanha alterou a lei e permite, atualmente, concessões por 50 anos e reforçou os benefícios fiscais das zonas francas, o que permite fixar novas empresas e novos terminais”.
“Nós queremos Setúbal, Lisboa, Leixões, Sines, Aveiro, Figueira da Foz e Viana do Castelo com investimento, porque o sistema portuário tem de viver do aumento de capacidade e da concorrência entre operadores, porque isso é bom para a economia. Mais concorrência significa mais dinamismo, taxas mais baixas, produtos mais baratos em Portugal e a economia a gerar emprego e a criar riqueza”, acrescentou, afiançando que o Estado vai continuar a apoiar o desenvolvimento do Porto de Setúbal.
Relativamente à polémica em torno do custo das dragagens, Sérgio Monteiro garantiu que “as dragagens iniciais – independentemente da localização do terminal – serão suportadas pelo investidor privado e não pelo Estado e/ou pelos contribuintes”. Contudo, o responsável dos Transportes revelou que os dados que o Governo dispõe “contrariam a avaliação apresentada no debate promovido pela Ordem dos Engenheiros e o estudo desenvolvido por José Augusto Felício”, afiançando que a Administração do Porto de Lisboa (APL) estima que os custos das dragagens deverão ser cerca de “um milhão de euros”.
O presidente do Centro de Estudos de Gestão do Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG), José Augusto Felício, no estudo intitulado “Análise Comparativa de serviços de contentores do Porto de Setúbal com o Porto de Lisboa” reitera que “o investimento previsto para o terminal de contentores da Trafaria e respetivas acessibilidades é superior a 760 milhões de euros. O investimento previsto para o terminal do Barreiro e respetivas acessibilidades é da ordem dos 750 milhões de euros a que se tem de juntar o investimento anual para a dragagem do canal fluvial da ordem dos 25 milhões de euros. O investimento previsto para o terminal de contentores de Setúbal e respetivas acessibilidades é da ordem dos 32 milhões de euros”, acrescentando ainda que “o porto de Setúbal comparativamente aos ‘hipotéticos’ terminais de contentores a construir na Trafaria ou no Barreiro tomando por referência o custo do transporte para a acessibilidade por via rodoviária às plataformas logísticas do Carregado, Quinta do Anjo, São Julião do Tojal, Porto Alto e Mem Martins é equivalente. Considerando os investimentos para a construção do Terminal da Trafaria e terminal do Barreiro apresenta enormes vantagens. A vantagem é bastante mais acentuada no caso do terminal do Barreiro, tendo em conta a necessidade de dragagens de manutenção do canal fluvial do acesso. Neste caso, o acréscimo de custo por tonelada movimentada, em média, é da ordem dos sete euros”.
À margem da Conferência “Porto de Setúbal – A resposta imediata – uma estratégia portuária coerente”, em Setúbal, José Augusto Felício explicou, ao Distritonline, que o valor apontado no estudo de sete euros por tonelada de carga movimentada é um valor “ponderado”, alicerçado, primariamente, “em informações cedidas por diversos técnicos” e, posteriormente, “no número de contentores que serão movimentados por ano”, sublinhando que é “um disparate”, que algumas entidades defendam que é possível dragar com um milhão de euros, outras com 35 e outras com 50 milhões. “O disparate que está aqui é que as pessoas não são suficientemente sérias naquilo que dizem, eu como cidadão sinto-me, realmente, incomodado com isso, uma coisa é errarmos, e o erro, infelizmente, faz parte da condição humana, outra é existirem intenções que levam as pessoas a fazer determinadas afirmações, o que é inacreditável, sobretudo quando as pessoas em causa têm responsabilidades públicas e devem ser os defensores, por excelência, do interesse público”, acrescentou.
Relativamente às afirmações do vogal do Conselho de Administração do Porto de Lisboa, Nuno Sanches Osório, que classificou, durante a conferência, o estudo elaborado pelo presidente do Centro de Estudo de Gestão de “surrealista”, justificando que os números “não têm aderência nenhuma à realidade”, José Augusto Felício foi parco em palavras, afirmando apenas que a pessoa em causa “não tem seriedade”.
Para o investigador, “é óbvio, linear, racional e intuitivo para pessoas que têm um conhecimento básico – não precisam de ser catedráticas, nem ter formação superior – que não tem sentido fazer outro investimento, quando já existe um investimento feito em Setúbal”.
O facto de não serem necessários grandes investimentos em Setúbal que poderia ser, aparentemente, a grande vantagem de Setúbal face à opção Barreiro, é para Frederico Spranger, presidente da Comunidade Portuária de Setúbal o, aparente, motivo da falta de interesse de “determinados setores empresariais da sociedade”.
“Num país onde se tem dito e repetido, interna e externamente, que vivemos acima das nossas possibilidades, a solução do Porto de Setúbal por não exigir um investimento adicional, nem garantias do erário público para a manutenção os acessos, como é o caso de outras alternativas que, aparentemente, têm obtido maior expressão mediática, demonstra que Setúbal é uma alternativa coerente com a política de investimento público defendida pelo Governo”, frisou Frederico Spranger.
Maria das Dores Meira, presidente da Câmara Municipal de Setúbal, enalteceu as mais-valias do Porto de Setúbal, em concreto a ampla capacidade instalada, o potencial de crescimento e as excelentes acessibilidades marítimas e rodoferroviárias.
“Quando se discute qual será a melhor solução para a construção de um terminal de contentores desejamos, sinceramente, que a capacidade e o potencial do Porto de Setúbal sejam tidos em conta”, realçou a autarca, sublinhando que este “desejo” não é “uma afirmação irracional de puro bairrismo”, mas sim “uma manifestação de vontade para que a melhor escolha seja tomada, com ponderação e rigorosa avaliação dos custos e dos benefícios de cada uma das alternativas”.
“Como autarca de Setúbal luto todos os dias para que o meu concelho seja mais desenvolvido, mais competitivo e mais coeso, mas também quero que o meu país seja mais desenvolvido, mais competitivo e mais coeso, por isso o que, realmente, desejo é que seja tomada a melhor decisão para Portugal”, finalizou.
Consulte aqui a Análise comparativa elaborada pelo professor José Augusto Felício.