No âmbito da candidatura autárquica a Alcochete, prossigo a sequência de argumentos sobre o racismo iniciada no artigo anterior e que será concluída no próximo.
Terceira nota racial: da realidade à ficção
No passado, o próprio sujeito autodefinia-se como racista. Tratando-se de um fenómeno social, isto é, partilhado com os outros, a autodefinição do sujeito nunca basta para validá-lo com rigor mínimo.Tem de existir uma lógica comprovável entre o discurso ou atitude,aquilo que se diz, e a prática ou comportamento, aquilo que se faz.
Se afirmar «Sou assassino», mas depois no trato com os outros tal nunca acontecer no máximo serei rotulado de mentalmentedescompensado. Jamais assassino. Neste caso, rigor significa comprovar que a realidade existe além das palavras.
A pretexto da luta antirracista, a dissociação entre o conceito e o factocomprovável, o abstrato e o concreto, o discurso e a prática é produto das universidades, criadas justamente por razões inversas. Fizeram-no para forçar a perpetuação artificial da superioridade moral da Esquerda. Como o racismo nas sociedades ocidentais foi deixando de existir porque a condição humana não é estática, e essas sociedadesnão pararam de se transformar profundamente na matéria desde o final da II Guerra Mundial (1939-1945), vimos nascer e prosperar academias apostadas em fabricar «conceitos científicos» fraudulentos– racismo estrutural é dos mais sonantes por não se sustentar em evidências empíricas comprováveis – e, por isso mesmo, apostadas em fabricar provas artificiais de racismo porque rumam em sentido contrário ao da transformação da realidade vivida.
Quanto mais o fenómeno desaparece do quotidiano do mundo ocidental, mais se multiplicam as provas da sua existência e mais se agrava a estridência antirracista que impõe punições e tratamentos radicais desde a mais tenra infância. À custa dos antirracistas, a dissonância cognitiva transformou-se em fenómeno social.
As «provas» do «racismo» tornaram-se cada vez mais indiretas, cada vez mais subjetivas, cada vez mais limitadas a meros indícios, cada vez mais seletivas (o alvo é a identidade branca), cada vez mais politicamente instrumentalizadas, cada vez menos racionais, cada vez menos abstratas e universais. Atingimos o ponto inquisitorial ou totalitário em que basta um olhar ou palavra errados ou inconvenientes para descer sobre o sujeito branco o violento anátemade racista.
Para qualquer cabeça racional, tal circo politiqueiro torna muitíssimo mais fácil comprovar como se dizimam intelectualmente comunidades, povos, nações ou civilizações do que comprovar o próprio «racismo».
Quarta nota racial: o cadáver em putrefação arrastado para fora do túmulo
O racismo equivale a uma Bola de Cristal suspensa no topo de uma estrutura por um conjunto de pilares. O racismo é do tempo do nazismo (1933-1945), da discriminação racial formal nos EUA (terminada nos anos 50/60), da colonização europeia (1415-1975), da guerra-fria (1945-1991) ou do apartheid na África do Sul (1948-1994)– fenómenos que passaram à história. O último foi fortemente chocante na sua fase final não por ser regra à época, mas justamente por ser o último resquício histórico de um mundo que se tinha transformado profundamente desde a derrota do nazismo, em 1945.
Quanto mais a realidade se transforma insistir em procurar nela com estridência aquilo que ela deixou de ser tem um nome: histerismo. Os movimentos antirracistas do século XXI são objetivamente histéricos e humilham os seus antecessores.
Se o conjunto de fenómenos históricos que sustentavam o racismo desapareceu na última década do século XX, a Bola de Cristal deixou de estar suspensa, caiu e fez-se em cacos. Supor que os cacos são o mesmo que a Bola de Cristal desaparecida é um caso grave de fuga à realidade por aqueles que não conseguem fazer o luto de um mundo que não controlam mais.
Claro que as identidades raciais e os fenómenos a elas associados não desapareceram. Porém, a sua natureza é hoje profundamente distinta da do século XX. Na vida quotidiana, nas relações de poder, no acesso à riqueza, nas virtudes e vícios – não há nada que hoje distinga as pertenças raciais.
Enquanto tolerarmos a validade da palavra racismo para designar fenómenos da atualidade estaremos a admitir que o branco é sempre o eterno culpado – mesmo quando é expulso da sua terra natal, assaltado, assassinado, humilhado e o mais. Pelo contrário, o negro e o cigano são sempre as eternas vítimas – mesmo quando a criminalidade apresenta níveis médios bem mais elevados nessas pertenças raciais do que nas demais, e não apenas a branca, e mesmo quando as evidências nos entram pelos olhos.
A complexidade do mundo de hoje não se ajusta ao conceito de racismo nascido, criado e vivido num tempo histórico que não é mais o nosso. No máximo sobram relações raciais ou relações inter-raciaisem que todas as pertenças raciais são inocentes ou culpadas enquanto coletivos. Em rigor, nem uma coisa nem outra. A única responsabilidade é do indivíduo, e aferida em função de circunstâncias concretas.
Para se ter um termo de comparação, na transição do século XIX para o XX, há um século, as sociedades ocidentais revelaram uma saúde mental coletiva que hoje perdemos. Naquela época, essas sociedadestiveram a lucidez de perceber a diferença entre a escravatura e oracismo. Ainda que o âmago dos fenómenos fosse o mesmo, a identidade negra, perceberam que eles eram inconfundíveis e, apesar de tudo, a transição que viveram constituiu um avanço civilizacional significativo. Rotular de forma distinta o que é social e historicamente diferente é a prova provada da lucidez e inteligência coletivas. Domesticada por académicos e jornalistas, a nossa geração nem disso é capaz: insiste teimosamente em desencantar o «racismo» e «racistas» a cada esquina.
Quinta nota racial: alienação mental coletiva, uma doença grave
Resta-me uma certeza e o direito de publicá-la numa sociedade livre, inteligente, civilizada: o racismo é hoje um fenómeno grave de alienação mental coletiva. Trata-se de uma doença mental coletivapoliticamente induzida.
É, por isso, no campo da loucura social que temos de situar o fenómeno e impormos a nós mesmos a terapia. Não existe outra que não seja a liberdade absoluta de discussão pública do racismo, mais ou menos como fazer da sociedade um divã e permitir que o senso comum, sem censuras, parta desse exercício em busca da renovação da nossa ordem moral coletiva. Para uma discussão ignorante e venenosa bastam os antirracistas. O caminho tem de ser diferente.
Não sendo possível uma aposta dessa natureza a nível nacional por causa da censura do regime, se os Alcochetanos confiarem o seu voto ao Chega, e porque as relações de proximidade num município com as características de Alcochete permitem quebrar a censura, Portugalverá nascer uma comunidade moral renovada, verdadeiramente digna, livre, cívica, mentalmente sã. O Chega vai levar o exercício terapêutico de sanidade mental coletiva às instituições locais, escolas, cafés, ruas.
Os Alcochetanos verão por eles mesmos, no quotidiano, quem respeita a Liberdade de Pensamento e de Expressão, a Democracia, o Civismo, a Moral Social.
Quando se desloca um fenómeno no tempo (do passado para o presente) e no espaço (da Alemanha Nazi, África Colonial ou, admitindo, EUA para Portugal e para a Europa) quem o faz desinsere o sujeito do seu meio envolvente, do seu tempo e do seu espaçoexistenciais. Essa é hoje a missão patológica dos antirracistas: arrancar a ferros a criança num parto artificial sem gravidez. Chama-se alienação mental. O racismo é das violentas.
Tão grave doença nasceu nas universidades e não parou de se massificar nas salas de aula do ensino básico e secundário, através da comunicação social, meios artísticos, elites intelectuais, agora em rituais ridículos dos desportistas. O Chega é a primeira força moral, intelectual e cívica que, em Portugal, vai resistir e não conheçomovimento tão preparado na Europa e no Mundo. É a nossa sanidade mental que está em causa. Alcochete terá tudo para testar com sucesso a única terapia possível: a liberdade da palavra.
(Continua: este é o segundo artigo de uma série de três.)
Por: Gabriel Mithá Ribeiro
(Professor, Investigador, Escritor e Colunista no Observador)