A Fatura da Água e o Combate ao Desperdício

O serviço público municipalizado de abastecimento de água, associado ao facto de estarmos localizados sobre um dos principais aquíferos do país, tem sido uma das maiores riquezas do nosso concelho ao longo dos últimos 83 anos e um dos fatores de qualidade de vida das populações. 

Em Janeiro, a Juventude Popular do Barreiro publicou uma nota de imprensa, na qual questionava o executivo camarário acerca das medidas que estariam a ser tomadas para mitigar as elevadas perdas de água no nosso concelho e reduzir a fatura da água a todos os barreirenses. Não obstante a preocupação legítima com um tema da maior importância para a população e cada vez mais discutido na agenda política do município, esta interpelação pública da JP acabou por ser, no mínimo, inoportuna. Apenas 15 dias antes, o Vereador João Pintassilgo prestara vários esclarecimentos acerca desta matéria, aquando da discussão e aprovação do tarifário dos serviços de águas, saneamento e resíduos para o ano de 2019, em Reunião Pública de Câmara. O tema voltou a ser discutido em Assembleia Municipal e novamente na última Reunião de Câmara, em que o executivo manifestou a sua intenção de se propor a uma candidatura a fundos comunitários, no âmbito do POSEUR, que permitirá apoiar financeiramente, em cerca de 40%, diversos investimentos com vista ao controlo e redução de perdas de água no nosso concelho, sendo mais um bom exemplo dos avanços notáveis que têm vindo a ser conseguidos nesta área. Aproveitando a oportunidade, são precisamente esses avanços que pretendo destacar neste artigo de opinião.

Comecemos pelo início. Quando falamos de água desperdiçada, estamos a referir-nos à água que se perde na rede por via das ruturas e à água não faturada por via de ligações ilícitas realizadas ao longo do tempo. No que respeita ao controlo e redução de perdas e de água não faturada, importa frisar os trabalhos de substituição do parque de contadores (13,3% substituídos em 2018 face aos 10,7% de 2017) e a colocação de novos contadores de consumos próprios em zonas críticas como o Parque da Cidade e o Parque Catarina Eufémia, entre outras. A título de exemplo, no lago do Parque da Cidade, onde se identificou o maior desperdício pontual localizado do concelho, o consumo de água foi reduzido em quase 90%, após a reparação do sistema de recirculação que se encontrava avariado há vários anos. De igual modo, há que destacar o combate ao consumo ilícito em vários pontos da cidade, a redução dos consumos próprios através do controlo de pressão dos sistemas de rega e o investimento significativo na requalificação e substituição da rede de abastecimento e no controlo de ineficiências e ruturas. De acordo com as estimativas apresentadas pelo executivo, estas medidas permitirão reduzir globalmente as perdas e desperdícios de 40% para cerca de 25%, o que colocará o nosso município abaixo da média nacional (30%). 

Em 2015, os municípios portugueses registaram perdas globais em água não faturada da ordem dos 235 milhões de euros. O investimento no controlo de perdas e desperdícios é essencial para, a prazo, além de podermos reduzir as tarifas de consumo de água, podermos também garantir às gerações vindouras a continuidade do fornecimento desse recurso natural em quantidade e qualidade indispensáveis à sobrevivência humana como é a água. Facto que, apesar de há muito referido, parece que só recentemente começou a despertar atenção, face à redução das reservas de água, por efeito das Alterações Climáticas.

Mas, para além destas tarifas, a tão debatida fatura global da água agrega ainda outras duas componentes fundamentais: os pagamentos a outras entidades como a SIMARSUL e a AMARSUL, correspondentes às faturas que os municípios têm de suportar relativamente ao saneamento e à recolha de resíduos. Também nestas duas vertentes, já há trabalho feito.

 A título de exemplo, prevê-se que o investimento que foi efetuado por este executivo na rede de saneamento, durante o ano de 2018, poderá levar em 2019 a uma diminuição de 25% para 17% das afluências indevidas de águas residuais nas condutas de águas pluviais. Estes resultados permitirão baixar a fatura que o município paga à SIMARSUL e consequentemente uma redução das taxas de saneamento no próximo ano, com um impacto positivo na fatura global da água. 

O investimento nas redes de abastecimento de água e de saneamento constitui um trabalho invisível de bastidores, por vezes gerador de grande incómodo para o dia-a-dia da população, e, talvez por isso, eleitoralmente desinteressante, mas que, no médio/longo prazo, terá um impacto positivo na qualidade do serviço prestado à população, nas contas do município e nos bolsos de todos os barreirenses. A falta de investimento do município, durante vários anos, na renovação de condutas e ramais já muito envelhecidos, em alguns casos com 60 anos, obrigou a que estas intervenções se tenham tornado mais frequentes. Há que abandonar uma lógica meramente reativa às ruturas que vão ocorrendo e adotar uma lógica preventiva nesta matéria.   

A alteração de hábitos e padrões de consumo no nosso próprio quotidiano também pode fazer a diferença. E isso passa não só por um consumo doméstico de água mais responsável mas também por reciclarmos o lixo que produzimos, diminuindo assim a quantidade de resíduos sólidos urbanos indiferenciados. Acontece que a produção destes resíduos indiferenciados tem aumentado, o que se traduz diretamente no valor da fatura. Neste sentido, foram instalados novos ecopontos distribuídos pela cidade que provavelmente já terá visto na sua rua. Quanto mais lixo doméstico produzido for reciclado, menor é o valor da taxa inerente à produção de resíduos sólidos urbanos que o município tem de pagar à AMARSUL, o que terá um impacto positivo na fatura da água. Mas para tal, é necessário que os resíduos recicláveis sejam depositados no ecoponto adequado, sendo a única forma de o valorizar, contribuindo para a redução da respetiva taxa.

Porventura, outra marca notável que este executivo tem deixado no setor das águas é o esforço de inovação e modernização que se tem traduzido na participação em inúmeros projetos/candidaturas e eventos internacionais de âmbito científico, tecnológico e educacional que poderão potenciar muitos dos projetos municipais já existentes e melhorar os indicadores de desempenho do sistema. Também ao nível do controlo e garantia da qualidade da água, o executivo encontra-se neste momento a ultimar o Plano de Segurança da Água. 

Em democracia, é tão leviano quem promete aquilo que não pode cumprir como quem toma decisões por impulso que, com o tempo, se revelam insustentáveis. O pior que poderíamos fazer aos barreirenses neste momento seria baixar, sem qualquer racional  de sustentabilidade, a fatura da água para posteriormente ter de fazer, porventura, marcha atrás nessa decisão. Para já, é preciso fazer primeiro o trabalho de casa e ter consciência de que baixar a fatura da água é o objetivo final de um caminho que já começou a ser trilhado desde o início do mandato com responsabilidade e com prudência. Foi nesse sentido que o executivo decidiu manter em 2019 o tarifário dos serviços de águas, saneamento e resíduos de 2018 e 2017, garantindo desta forma o equilíbrio financeiro dos serviços e as condições de investimento na renovação e na expansão das redes de abastecimento de água e de saneamento. Mais, este tarifário permitirá acomodar os aumentos decorrentes da inflação, recomendados pela Entidade Reguladora, bem como o impacto ao nível da receita associado à tarifa social automática, à qual o nosso município aderirá e que significará para muitos munícipes (estima-se que entre 1600 e 6000) uma poupança no orçamento familiar já este ano.

Se é verdade que, até 2017, o Barreiro esteve em destaque pela negativa, face aos fracos resultados no combate ao desperdício de água, fosse por ausência de financiamentos à renovação das redes de água em baixa, ou por critérios de prioridade política, o trabalho que tem sido desenvolvido pelo atual executivo é talvez a melhor garantia que os barreirenses podem ter confiança num serviço de qualidade e economicamente acessível, bem como numa gestão sustentável e capaz de projetar o futuro. Não é possível fazer em dois anos aquilo que não foi feito nos últimos doze. Tenho a certeza que os progressos alcançados serão fundamentais para garantir muito mais do que, a prazo, baixar a fatura da água. Serão acima de tudo um caminho de futuro para continuar a assegurar a todos os barreirenses o aprovisionamento de um bem tão precioso para todos nós e para o ambiente como é a água. 

Emanuel Marques

Vice-Presidente da JS Barreiro

Autarca na União de Freguesias do Alto Seixalinho, Santo André e Verderena