“- … caraças do vírus que não nos larga.
– Covid do caraças!!
– Parece um carrapato.
– Covid do carraças!!!”
Há dias trocava estas mensagens com uma pessoa. Ela achou graça eu ter dito que o Covid era do carraças; eu também, mas fiquei a pensar num cão vadio que havia lá no bairro, quando era miúdo. Não sei quantas carraças tinha, mas lembro-me de uma grande, na barriga, sempre no mesmo sítio. Também não sei porque é que não lha tirámos, eu mais os outros miúdos; talvez por receio, ou falta de cuidado. Mas também não sei porque é que não a tirou ele próprio; talvez também pensasse como nós, à sua maneira.
Certo é que parecia que ele não se incomodava muito. Se calhar incomodava, mas eu nunca o vi queixar-se de nada, pelo menos que me tenha apercebido. Para além da que se via na barriga, ele devia ter muita mais bicharada que não se via, e não só carraças. Devia ter grandes defesas também, para suportar isso, e os invernos, sem ir ao veterinário ou tomar remédios.
Deve ter sido isso que me fez lembrar o Carraças. Ainda não existe remédio para o Covid, e já estamos em Setembro, e vem aí o frio e outros vírus da época. Também vai haver mais pessoas a circular, e por isso mais possibilidades de relação com todos esses vírus diferentes – já para não falar nas possibilidades de mutação do próprio Covid, que quando encontrarmos uma vacina para este pode já ser outro: Covid do caraças!!
Até pode ser que tal como outros vírus, este também venha para ficar (qual carrapato), e apenas mude de caraça de vez em quando, talvez de Inverno em Inverno. E então, para além do controlo doutras doenças, também vai ser necessário controlar esta, e talvez tomar um bocadinho de Covid de vez em quando para estar vacinado.
Ou então pode não acontecer nada disto, e isto ser apenas uma especulação que não se verifica na realidade. Se bem que esta ninguém saiba como vai ser. Houve-se dizer que este é um vírus novo, de que ainda se sabe pouco, e portanto não é possível fazer grandes previsões. E se não é possível fazer grandes previsões em relação ao vírus, também não deve ser possível fazer grandes previsões em relação à economia, pois como se viu o comportamento dele tende a reflectir-se no comportamento dela – isto de algum modo fez-me lembrar outra vez o Carraças, talvez pela situação em que ele se encontrava.
Mas o Carraças era um cão vadio, que não tinha quem olhasse por ele. Nós, miúdos, não soubemos olhar por ele. Não sei se ele também não soube olhar por ele; acho que soube, como pôde, à sua maneira. Creio que não foi por falta de cuidado que se pôs na situação em que estava; mas que teve o cuidado que pôde, soube ter. Nós como miúdos talvez devêssemos poder, saber ter outro cuidado; nós como adultos temos de poder e saber tê-lo.
Cuidado connosco, conforme soubermos e pudermos, para tentarmos não ficar doentes; e cuidado com os outros, que sabem ou podem menos que nós. Os médicos dizem para não descuidarmos as doenças agudas, mas também para não descuidarmos o bem-estar físico e mental. É preciso cuidado com o vírus, e com os procedimentos necessários para o evitar, mas também com a nossa saúde e capacidade de resiliência, para nos podermos ajudar a nós próprios e uns aos outros.
Em miúdo olhava para o Carraças e ele parecia-me bem, e resistente aos vírus. Mas desgraçado, ninguém olhava por ele, e nem ele sabia olhar por ele. Hoje posso não saber qual vai ser a realidade, ou o mundo que vamos ter, mas sei que não quero que seja o mundo do Carraças.
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