Atendendo à profusão de notícias que têm recentemente vindo a público acerca do projeto do terminal de contentores do Barreiro (TCB) e sobretudo das recorrentes declarações públicas de diversos altos responsáveis envolvidos, entende a Comunidade Portuária de Setúbal (CPS) obrigar-se à expressão dos seguintes considerandos:

 

  1. A recente mudança do projeto inicial do TCB em versão “terminal de contentores de águas profundas” para a atual “Plataforma Multimodal do Barreiro” (TMB) e as também recentes declarações da Sra. Ministra do Mar, assumindo que os pressupostos do projeto foram alterados, corroborados em seguida pela Sra. Presidente do Porto de Lisboa ao afirmar que o projeto tem “condições de criar uma plataforma logístico-industrial para dinamizar a economia da Península de Setúbal e em particular o Barreiro (…) em concessão tipo BOT”, levantam-nos, desde logo, legítimas preocupações e muitas reservas quanto aos objetivos do projeto.

 

  1. Se estamos a falar de uma nova infraestrutura para a exclusiva movimentação de contentores, mesmo como investimento em capacidade excedentária, incluindo dragagens, quer de primeiro estabelecimento, quer as de manutenção, mas desde que assumida integralmente por capitais privados e sem prestação de garantias do Estado, nada obstará à sua prossecução.

 

  1. Mas se o conceito evoluir para um terminal tipo multiusos, possibilitando a movimentação de outras cargas adstritas ao mesmo “hinterland” que já assiste ao porto de Setúbal, então estaremos na primeira linha para “contrariar” o projeto. Desde logo, porque Setúbal tem já uma capacidade disponível ainda muito longe da saturação, ampliando mais ainda a sua oferta após as obras de aprofundamento da barra e canais de manobras previstas para se iniciarem ainda durante o corrente ano e as previstas para uma segunda fase, colocando-o em paridade muito semelhante ao atual paradigma TMB. Com a agravante que as obras de Setúbal terão custos à volta dos 25,2 M de euros (metade dos quais provenientes de fundos comunitários), enquanto o projeto Barreiro aponta para valores astronómicos na ordem dos 600 M de euros, desconhecendo-se ainda o que poderá vir a ser gasto, e por quem, em acessibilidades, para além dos 600 mil euros entretanto já em curso para estudos e levantamentos da obra, por conta do Estado.

 

  1. A este propósito, é indispensável invocar os próprios números constantes da “Estratégia para o Aumento da Competitividade Portuária”, no que respeita ao investimento estimado para o período 2016-2026, versus crescimento da carga, segundo os quais o porto de Setúbal apenas necessita de 5,6 M de euros por cada milhão de toneladas de crescimento, enquanto o mesmo rácio para Lisboa é de 133,2 M de euros, ou seja, quase 24 vezes mais investimento para obter níveis de crescimento similares.

 

  1. Dir-se-á que o critério diferenciador será a aposta no investimento privado, prevendo-se que possa atingir níveis de 83% no âmbito daquela Estratégia, designadamente em Lisboa, Leixões e Sines. Contudo, e para nós, incompreensivelmente, nada é referido quanto aos projetos “Setúbal Plus” e “Blue Atlantic”, este de iniciativa igualmente privada, enquanto infraestruturas de expansão natural do porto de Setúbal, a custos incomparavelmente mais baixos e com índices de rentabilidade de muito menor incerteza que qualquer outro a construir de raiz e em condições de tanta controvérsia e por isso mesmo, de tão alta polémica.

 

  1. Defende a CPS que o aumento da competitividade dos portos portugueses deverá assentar em critérios de racionalidade e sustentabilidade no investimento, quer público, quer privado, privilegiando-se sempre a rigorosa gestão dos recursos disponíveis.

 

Quando os critérios assentam em outros objetivos, defendendo aparentemente interesses de âmbito regional, ainda que legítimos, podem pôr-se em causa os equilíbrios de todo o sistema logístico-portuário, enquanto recursos efetivamente complementares nas suas diversas valências.

 

Declina-se, por isso, a multiplicação de infraestruturas equivalentes, privilegiando-se definitivamente o foco na competitividade, na eficácia e nas respostas concretas às necessidades do mercado real, sem utopias ou desfasamentos de cenários com muitos “estudos encomendados” que normalmente nos arrastam para o mundo da fantasia.

 

Comunidade Portuária de Setúbal