Sempre me senti como sendo uma “pessoa de pessoas” e desde cedo que me vi em funções (no desporto, enquanto jogador e posteriormente como treinador) onde a performance e o rendimento individual, desaguando num trabalho de equipa orientado para a concretização de objetivos, são vectores centrais para se atingir resultados coletivos de médio e longo prazo. Claro está que no desporto este é um processo alicerçado em pessoas. E em talento individual. Por isso nunca vi, enquanto gestor, as pessoas como recurso compartimentado no “Departamento de Recursos Humanos”. Elas são a parte central do qualquer operação e não um silo dentro das organizações. Bem sei que falar é fácil e ao longo do minha vida tenho ouvido uma frase que mostra exatamente isso, uma frase que se tornou numa daquelas que me fazem eriçar os pelos da nuca. Aqui fica a “maldita”:

“O melhor da nossa empresa/organização/associação/Cidade (escolha a opção que para si servir melhor) são as pessoas!!”

E sabe porque na maioria das vezes não gosto desta frase? Porque se perguntarmos em seguida qual a estratégia de captação, desenvolvimento e aproveitamento do talento que está subjacente àquela afirmação a resposta é vazia. Se não de palavras, pelo menos de conteúdo.

Honestamente não penso que quem faz estas afirmações sem uma lógica de operacionalização da mesma não acredita no que diz. Aliás, tenho a certeza que não só acredita como por vezes pensa que o pratica. Se não por processo, pelo menos por convicção. Lembro-me sempre de um gestor de uma PME que dizia (e sei que o sentia convictamente) que o “melhor da sua empresa são as pessoas”. Um dia questionei-lhe que como a empresa estava a perder colaboradores para outros concorrentes, estava a ficar com cada vez menos pessoas para gerir e a perder a melhor parte da empresa. Pelo menos, segundo as suas palavras. A sua resposta foi tão rápida quanto impotente: “Mas o que posso eu fazer, se as pessoas preferem ir para outro lado?”. A questão para mim é que se ele queria substituir as competências que perdeu, sendo que os seus colaboradores ganharam parte considerável delas dentro da sua organização, dificilmente poderia recrutar fora da empresa. Mas se recrutasse internamente tinha que mexer com vários departamentos que não estava preparados para perder colaboradores. Em vez de mexer apenas com uma parte do negocio, iria interferir com mais sectores da organização. As suas dúvidas são mais que legitimas e pela minha experiência, são comuns a dezenas de gestores de empresas por todo o Mundo. Os colaboradores de cada organização e o talento que existe dentro dela não são responsabilidade apenas do Departamento de RH, são transversais a toda a empresa. Por isso a função de Chief of Talent faz cada vez mais sentido nas organizações que fazem das pessoas e do talento o centro da sua atuação e uma das suas vantagens competitivas. Mesmo que nas PME ́s seja acumulada pelo seu gestor principal, corporizando a frase que tanto gostamos de dizer. Contudo, mais do que o título, é necessário um sistema de gestão de talento simples e reflexivo, que mais que nos dizer quem vamos contratar nos faça refletir no que queremos contratar. Desenvolvi nos últimos 4 anos um guião que uso para me guiar quando quero recrutar alguém ou quando alguma organização me pede ajuda para desenvolver um sistema de gestão de talento. Mais do que dirigido a quem vamos recrutar, ele encontra-se destinado para quem recruta ou para a organização que dele se socorre e baseia-se em três pilares base: o que recrutamos, o que precisamos e como medimos o sucesso.

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A primeira questão que acho que devemos fazer é definir se queremos recrutar com base no potencial de uma pessoa ou se com base no seu passado e track-record a fazer aquilo que esperamos que faça na nova função. Se for com base no seu potencial, como o vamos desenvolver para capitalizar o seu talento e como o vamos integrar na empresa para que ganhe o máximo de competências intrínsecas à nossa organização? Se o recrutamento for com base no seu track- -record, como o melhoramos e o integramos na empresa de forma a que crie sinergias com quem já cá se encontra?

Devemos ainda ter bem definido o que precisamos, se queremos manter a função como estava anteriormente ou se procuramos um upgrade da mesma e da sua capacidade de resposta. Isto é fundamental pois vai incidir na forma como medimos o sucesso de cada colaborador e da forma como a empresa pode fazer a gestão do erro (podendo-o ver inclusive como uma experimentação e aprendizagem para novos conceitos a explorar). Seja qual for a sua base de recrutamento, nunca se esqueça de definir um sistema de sucessão interno para cada função, sabendo como incorpora gente nova à organização e como pode expor os colaboradores existentes a diferentes áreas de atuação, contribuindo para que tenham uma visão holística da empresa e que não trabalhem (e pensem) em silos internos de conhecimento.

Devo dizer que nunca fui adepto de relacionamentos profissionais baseados em “palmadinhas nas costas”, informalidade de circunstância e direitos sem deveres (de ambas as partes). O pilar que me norteia é a honestidade para comigo próprio e, por inerência, para com quem trabalho em cada organização. Estamos todos no mesmo barco! Mas se as pessoas são realmente o melhor que temos na nossa organização, não deixemos de ter em prática um sistema que maximize o aproveitamento do seu talento para o output final que todos queremos que seja o melhor possível.

O Talento é a moeda do século XXI. Saibamos aproveitá-lo e seremos uma sociedade de futuro e preparada para ser competitiva!

 

Autor:

Frederico Rosa

Gestor