Os Artistas Unidos apresentam UMA SOLIDÃO DEMASIADO RUIDOSA a partir do romance de Bohumil Hrabal em Setúbal, no Fórum Municipal Luísa Todi, no Festival Internacional de Teatro de Setúbal, a 23 de Agosto.
O espectáculo é uma adaptação do encenador e protagonista António Simão.
UMA SOLIDÃO DEMASIADO RUIDOSA a partir do romance de Bohumil Hrabal De e com António SimãoCenografia e Figurinos Rita Lopes Alves Luz Pedro Domingos Produção Artistas Unidos M12
No Festival de Almada, no Incrível Almadense de 10 a 12 de Julho
Nas Caldas da Rainha, no Teatro da Rainha de 16 a 18 de Julho
No Festival Internacional de Teatro de Setúbal a 23 de Agosto
No Teatro da Politécnica de 27 de Agosto a 19 de Setembro
No Teatro Municipal Joaquim Benite de 25 a 27 de Setembro
No Cacém, no Auditório Municipal António da Silva a 3 de Outubro
O céu não é humano e o homem que pensa nem sequer pode ser humano.
Bohumil Hrabal
Criado em 1997, com estreia no CCB, os Artistas Unidos retomam agora, 23 anos depois, um espectáculo criado por António Simão.
Em Praga, há uma cave. Brilhante como uma gruta de tesouros. Sombria e suja como um esgoto. Nessa cave há milhares de livros, centenas de ratos, visões passageiras e palavras que tornam o mundo grande. E há um homem, Hanta. Que há 30 anos empurra afectuosamente os livros, os mais belos e mais banais, para a prensa que os tritura e transforma em cubos de papel. Mas Hanta é um “carniceiro terno”. Sabe salvaguardar as palavras guardando-as na sua memória, para que elas brilhem que nem sóis, e para que esses sóis o ajudem a ver como pode ser a vida de um homem. Por entre a poeira, o suor e o cheiro a cerveja que não pára de beber, Hanta fala-nos.
Evelyne Pieiller
UMA SOLIDÃO DEMASIADO RUIDOSA
Este monólogo barroco transporta-nos ao ambiente amarelecido e cru da Checoslóvaquia de Kafka, afinal símbolo universal do absurdo existencial que povoa as nossas vidas. Uma história simples. Um homem, um funcionário que vive algures numa casa escura e velha cheia de livros. Um homem cuja função é prensar papel velho numa cave; todos os dias toneladas de livros. Um homem solitário, que vive das memórias do passado, das frases livrescas e das canecas de cerveja; como um vagabundo que lê todos os livros que passam nessa cave, um homem culto sem querer; como o “velho do rio” que pensa e filosofa sobre uma série de coisas, que bebe canecas e canecas de cerveja, não para se embebedar, mas para pensar melhor. Um contador de histórias. Um velho que sente estar a ser ultrapassado pelo tempo no qual já não tem lugar. Um poeta da realidade.
” Foi convicto que decidi partilhar este livro e por isso fazer um monólogo. Um monólogo sobre este trabalhador e a partir desse texto maravilhoso, pensamento vivo, vivificante e vivificador. Texto rico falando de pobreza, texto barroco falando de simplicidade. Uma escrita tão humana quanto lírica, uma festa de ideias e de sentidos. Foi de imediato que reconheci este contexto, esta Checoslováquia assolada pela guerra. Pelo início da industrialização e do consumo, com as suas caves e catacumbas, o ambiente de conspiração kafkiana. Das vidas desgraçadas e horríveis, povoadas de criaturas cheias de pobreza e sofrimento, mas também de beleza, de ingenuidade e de sonho. Realidades semelhantes em tantos outros locais, em ambientes diferentes, com ecos diferentes. Como é o caso de Portugal e dos seus trabalhadores nos cais, nas fábricas, que vivem em casas algures na Madragoa ou em Alfama, nas suas caves e cubículos e do fado tão infeliz e nostálgico, tão cheio de pensamento. Que se levantam às seis da manhã, bebem uma taça de vinho e em festa vão trabalhar o dia todo.” (1997)
Relembrando o texto de apresentação deste espectáculo escrito há já mais de vinte anos, não posso deixar de recordar o magnífico romance do autor checo que, fazendo jus ao estilo barroco, à chamada Praga mágica e ao casamento do amor plebeu e da imaginação barroca, como disse Kundera, nos dá uma lição de história com muito mais de trinta e cinco anos, que é o tempo de que fala a personagem do romance, (desde a II Guerra até ao Maio de 1968), uma vez que mergulha nas pulsões do intemporal inconsciente do mundo, voltando dele a sair resplandescente.
Relembrando o texto de apresentação deste espectáculo escrito há já mais de vinte anos, verifico que o reconhecível contexto checo de que falava, já não se localiza em Alfama ou Madragoa, agora habitáculo da gentrificação e do turismo desenfreado, mas tentando ser honesto com a memória, talvez se encontre na minha infância vivida num dos inúmeros subúrbios de Lisboa nos idos anos oitenta, quando começava a florescer inevitável o consumo capitalista, tão presente nos dias de hoje e quando com ele coexistia o ingénuo sentimento de esperança num futuro que se imaginava como pedra bruta pronta a ser esculpida.
Não comungarei agora da “ beleza” e da “ festa”, porventura sofrendo de um desacreditar que não está ligado a nenhuma fé cristã mas a tempos mais sombrios que se aproximam. Aquilo de que sofreu Hanta, a personagem de Uma Solidão Demasiado Ruidosa, chega nestes nossos dias ao pico do seu horrendo desenvolvimento – a industrialização, a tecnologia, o consumo e a desumanização.
Este espectáculo terá razão de existir, ou de voltar a ser apresentado, na continuação de uma fé e numa admiração pela beleza do que é humano e da sobrevivência do mesmo, esperando que um dia não tenhamos de procurar, como o louco de Nietzsche procurando Deus à luz do dia com uma lanterna, por uma humanidade desaparecida, como aconteceu em períodos mais negros da nossa história. (2019)
António Simão
“Um texto surpreendente de um fabuloso autor checo ainda pouco conhecido em Portugal e que nos legou, entre outras coisas, esta obra-prima chamada Uma Solidão Demasiado Ruidosa. António Simão soube, duas décadas depois, pô-la em palco. Magistralmente.”
Rui Ferreira e Sousa
Público
“Nada mais bonito do que poder o espectador, em especial quando é crítico, elogiar o espectáculo que viu. Dizer: Eh! Companheiro, coisa linda que você deu. Porque isto de sair de casa e ir a um lugar onde alguém espera por nós para nos proporcionar, mesmo que sozinho ou por isso, um texto e um trabalho tão bons, merece uma palavra de gratidão, outra de aplauso, a terceira de incentivo.”
Carlos Porto
Jornal de Letras
“Um feliz caso de recriação dramática de um texto narrativo que nada fica a dever ao original, É, ainda, um excelente trabalho de interpretação, na coerência da construção e na eficácia comunicativa que a situação de monólogo estabelece com o público.”
João Carneiro
Expresso
“Quanto à paixão do actor António Simão por este texto, vale a pena ver a energia e a violência que coloca neste one man show tão movimentado e frenético quando pode sê-lo um solilóquio. Toda a crueza e toda a surreal-abjecção do texto passa pelo corpo do solista que é indispensável ver.”
Manuel João Gomes
Público
BOHUMIL HRABAL nasceu em Berno, em 1914, e morreu em Praga, em 1997. Estudou direito em Praga, onde foi empregado de notário, marçano, ferroviário, angariador de seguros, caixeiro-viajante, operário siderúrgico, figurante de teatro. Só em 1963 publicou UMA PÉROLA NO FUNDO – e logo foi saudado como um grande escritor na esteira de Hasek ou Kafka. Em 68, a sua obra foi proibida na Checoslováquia, só voltando a ser publicada em 76.
ANTÓNIO SIMÃO tem os cursos do IFICT (1992) e IFP (1994). Trabalhou com Margarida Carpinteiro, António Fonseca, Aldona Skiba-Lickel, Ávila Costa, João Brites, Melinda Eltenton, Filipe Crawford, Joaquim Nicolau, Antonino Solmer e Jean Jourdheuil. Integra os Artistas Unidos desde 1995, tendo participado recentemente em Do Alto da Ponte de Arthur Miller (2018), Ballyturk de Enda Walsh (2019).
RITA LOPES ALVES trabalha com Jorge Silva Melo desde 1987. Assinou o guarda-roupa de vários filmes de Pedro Costa, Joaquim Sapinho, João Botelho, Margarida Gil, Luís Filipe Costa, Cunha Teles, Alberto Seixas Santos, Pedro Caldas, Teresa Vilaverde, Carmen Castelo Branco, José Farinha, Teresa Garcia, Fernando Matos Silva e António Escudeiro. É, desde 1995, a responsável, nos Artistas Unidos, pela cenografia e figurinos.
PEDRO DOMINGOS trabalha com Jorge Silva Melo desde 1994, tendo assinado a luz de quase todos os espectáculos dos Artistas Unidos. É fundador do Teatro da Terra, sediado em Ponte de Sor, que dirige com a actriz Maria João Luís.
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