Carta aberta às cartas abertas, à comunicação social coxa, aos produtores de cartazes e a todos os que a carapuça lhes servir.
Permitam-me a cópia estilística de uma carta aberta que li por aí:
“Sabem o que custa ver uma multidão de pessoas, a opinar sobre uma resolução que não leu? Sabem o que custa ver que várias gerações que se dizem livres, são aquelas que (neste e noutros casos) ficaram reféns de uma oferta e escrutínio jornalístico fracos?
Sabem o que custa ver que se aplica aquela frase “uma mentira repetida muitas vezes torna-se verdade”?
Sabem o que custa ver que aqueles que tentam restituir a verdade são caracterizados como complacentes com o tráfico humano no mediterrâneo?”
Foi com estupefacção que vi irromper pelos ecrãs uma avalanche de notícias, cartas abertas, cartazes e opiniões devidamente fundamentadas acerca de uns assassinos que por vezes davam pelo nome de deputados.
Pelos vistos, esses sanguinários, teriam votado contra uma moção que visava o reforço do salvamento de migrantes. Nessa avalanche lá iam aparecendo os nomes dos deputados portugueses cujo sentido de voto foi desfavorável ao da moção.
O problema das avalanches é que começam pequenas com pouca significância e gravidade, mas rapidamente crescem, tornam-se perigosas e os seus danos são irreparáveis.
E assim foi, esta avalanche começou pela fabricação de notícias e opiniões por parte e a pedido dos eurodeputados e seus partidos cujo ressabiamento e tacticismo cegou.
Nesta cegueira perderam qualquer tipo de nível que algum dia tivessem auferido e desataram a explorar ao máximo o que poderiam retirar da votação. Dado o pontapé de partida, foi hora de os amplificadores darem eco aos grandes opinadores dos nossos tempos, que se julgando no seu direito diziam-se envergonhados por terem deputados “destes”. Tendo esta malha absolutamente credível e confiável, quase deuses da opinião, dado o mote para a partilha fácil, segue-se a partilha automática, seguem-se os títulos bombásticos, qual cmtv, segue-se a indignação geral. Seguiu-se a hiperatividade das falanges em imprimir os maiores insultos e injurias, seguiu-se a loucura geral, o comentário e discussão sem ocaso, afinal aquele grupo híper informado estava finalmente a defender os direitos humanos de alguém.
Enganam-se, estavam a servir os mais obscuros interesses de uma corja que durante este tempo foi do mais humanista que existia cá no burgo.
Esses humanistas, sabendo as notícias que fabricavam, não tiveram qualquer pudor em retirar dividendos daqueles que já nada têm, esses humanistas, não tiveram qualquer problema em fabricar noticias e encher Portugal de notícias falsas que tanto abominam, esses humanistas, não tiveram qualquer pudor em informar parcialmente os portugueses e assim privá-los da sua liberdade de informação.
Vão longe os tempos onde se lutava por se ter os livros e publicações sem censura, vão longe os tempos que os defensores da liberdade não a queriam só para si, mas para todos. Vivemos tempos onde a censura selectiva reina, vivemos tempos onde são oferecidas palas a cada um que as quiser colocar, vivemos tempos onde a preguiça da investigação leva à servidão.
Dizemo-nos livres, mas só lemos aquilo que nos dão para ler.
José Coutinho