A atual líder da Federação Distrital de Setúbal do PS, em entrevista exclusiva ao Distritonline, admite a abstenção e o crescimento dos votos brancos e nulos que se tem verificado nos últimos atos eleitorais espelham que “para muitos milhares de portugueses” os políticos e os partidos não são “suficientemente credíveis para merecer a confiança do voto” e, por isso, os políticos devem alterar comportamentos. Em relação às eleições de 28 de setembro, a socialista acredita que “o processo das primárias é um fator de diferenciação positiva da vida partidária em Portugal e que será um primeiro passo na alteração dos métodos de funcionamento dos demais partidos”.
Madalena Alves Pereira está, novamente, na corrida à liderança da Federação Distrital de Setúbal, cujas eleições realizam-se no próximo dia 5 de setembro, mas assume que não é a “proteção ou projeção de uma qualquer candidatura de âmbito nacional” que a motiva: dar continuidade a um novo ciclo que iniciou há dois anos é o que a faz correr.
Distritonline [DO]: Que balanço que faz do primeiro mandato enquanto presidente da Federação de Setúbal?
Madalena Alves Pereira [MP]: Se a pergunta pede uma resposta circunscrita a positivo ou negativo, a resposta é positivo. Foi um mandato intenso, com muitos desafios internos e externos, com alterações de práticas políticas, umas induzidas por nós no campo partidário, outras pelas inovações legislativas, quase todas más, como foram aquelas que marcaram o governo local e a limitação à autonomia do poder local.
DO: O que é que a levou a recandidatar-se?
MP: Inequivocamente a vontade dar continuidade a um trabalho político, a um novo ciclo que iniciámos há dois anos atrás. Recandidato-me por Setúbal, o distrito onde vivo e trabalho, onde milito. Motiva-me o trabalho com os militantes do meu distrito e com nossos concidadãos de Setúbal. Recandidato-me por tudo isto, e muito antes e para lá de qualquer alinhamento, proteção ou projeção de uma qualquer candidatura de âmbito nacional.
DO: Na Moção, que apresentou ontem em Setúbal, refere que um dos objetivos é a criação do Parlamento Aberto e do Parlamento do Distrito, em que é que consistem?
MP: Ambas as iniciativas são o materializar da proximidade e da responsabilização dos mandatos que defendemos como princípio de ação política. O Parlamento aberto é instituir um espaço de atendimento aos cidadãos do distrito onde possam contatar os “seus” deputados, colocar-lhes questões, formular propostas, manifestarem preocupações e chamadas de atenção para realidades pessoais, profissionais, sociais e outras que possam até carecer de regulamentação legal ou tão-somente sentirem-se ouvidos e envolvidos por quem os representa. Sentirem que os deputados lhes podem ser úteis.
O Parlamento no Distrito é aproveitar o dia regimentalmente consagrado para contacto com os eleitores e promoverem visitas pertinentes e necessárias de acordo com a temática política que revele mais atualidade, mas incluindo obrigatoriamente todo o setor da Educação, função do Estado que deve assegurar o cumprimento do princípio da igualdade de oportunidades; o universo laboral por ser aqui que está o maior desafio para qualquer político neste momento, o emprego; e uma especial atenção para todas as instituições que atuam na área da economia social e que representam um fator importantíssimo de realização dos princípios da solidariedade e da fraternidade: a coesão social que advém pelas atribuições que estas instituições podem prosseguir, desde o pré-escolar, ao desporto, a cultura, o lazer, a assistência à terceira idade, os cuidados de saúde, etc.
DO: Ainda na moção, nota-se uma clara preocupação com a credibilidade política. Porquê?
MP: A abstenção que se tem verificado nos últimos atos eleitorais, a par do crescente aumento de votos em branco e nulos tem de merecer uma reflexão e uma resposta por parte dos políticos. O problema é nosso. Da nossa capacidade de criarmos confiança na nossa ação, no nosso comportamento e nos objetivos que alcançamos em prol dos nossos concidadãos. O que estes resultados eleitorais evidenciam é que nós, políticos e partidos políticos, para muitos milhares de portugueses não somos suficientemente credíveis para merecer a confiança do voto. E afinal é isso que nós queremos: ser credores da confiança do voto. Logo, temos que alterar os nossos comportamentos, adequando-os a uma exigência cada vez mais de cumprimento, responsabilização, prestação de contas, entre outras medidas. E fazê-lo de forma pública, transparente com separação entre a atividade política e a atividade privada ou profissional de cada um de nós.
DO: Acredita que os resultados das últimas eleições autárquicas podem pesar na reeleição?
MP: Das eleições autárquicas e das europeias, também. Todos os resultados pesam, os bons e os menos bons. E há resultados menos bons agora que darão frutos nas próximas eleições e outros que serão consolidados e ampliados, seguramente.
DO: O distrito de Setúbal, particularmente os concelhos de Setúbal e do Seixal possuem elevadas taxas de endividamento. Na sua opinião, o que é que deve ser feito para que estes casos sejam sanados?
MP: Políticas realistas, com prioridades bem definidas, rigorosas e transparentes. Se percorrer, por exemplo, os orçamentos destas duas autarquias que identifica encontrará um número infindável de prestações serviços intencionalmente indefinidas, cuja utilidade e necessidade de contratação não são cabalmente fundamentadas. O problema não é ter endividamento porque este não é necessariamente mau se for feito em benefício das populações. Grave é quando não temos esse retorno e não percebemos onde ou como foi feita determinada despesa. É compreensível, é admissível que o município do Seixal suporte pelo arrendamento de dois edifícios onde tem instalado parte dos seus serviços uma renda mensal no valor de 370.000€?!
DO: Quais as principais divergências entre a sua candidatura e a da Ana Catarina Mendes?
MP: A minha candidatura é por Setúbal, pelos militantes e pelos meus concidadãos. Para dar continuidade a um trabalho iniciado há dois anos atrás que entusiasmou e motivou muitos militantes e simpatizantes e está, como lhe referi, antes e para lá de qualquer candidatura nacional.
DO: Os encontros que tem mantido, um pouco por todo o distrito, com militantes no âmbito da apresentação da candidatura a líder da Federação de Setúbal, fazem-na acreditar na vitória?
MP: Sim. Por Setúbal, juntos e mais fortes ganharemos.
DO: Relativamente às eleições primárias do PS, esperava que António Costa avançasse com a candidatura depois da vitória do PS nas Europeias?
MP: Assim que tomei conhecimento dessa disponibilidade manifestei a minha perplexidade pela decisão, ou seja, não esperava. Com o passar do tempo sou forçada a rever a minha posição inicial. Certo é que, a cada um de nós, no PS, assiste sempre o direito de tomar as iniciativas que julga adequadas no exercício da sua consciência cívica e militância e que tenham cabimento no quadro estatutário em que nos movemos. Daí para a frente a decisão cabe aos militantes e, neste caso, também aos simpatizantes do PS.
DO: Teme que o partido fique, de algum modo, descredibilizado perante a opinião pública e a oposição, particularmente o PSD, com a realização das primárias?
MP: De todo. Entendo que o processo das primárias é um fator de diferenciação positiva da vida partidária em Portugal e que será um primeiro passo na alteração dos métodos de funcionamento dos demais partidos. É um sinal importantíssimo da abertura do PS à sociedade, aos não militantes, pedindo o contributo destes para a melhor decisão.