“Alto! Quem vem lá?” é uma expressão muito conhecida no seio militar e que era a forma definida para um sentinela abordar quem se aproximasse do seu posto e pelo qual só passaria após correta identificação recorrendo a um modelo de senha e contra-senha.

Hoje em dia fruto do fim do Serviço Efetivo Normal é cada vez menos conhecida, mas como o tema das Forças Armadas é especialmente querido, “Alto! Quem vem lá?” ou simplesmente “Alto!” é uma expressão que utilizo sempre que algo me espanta, aproveitando o contexto dado pela expressão em si. Resolvi abordar este tema que parece sempre envolto nalguma espécie de tabu. Isto acontece a meu ver porque por um lado os próprios militares não se podem manifestar devido aos seus regulamentos e por outro lado, a classe política relega para um plano mais baixo as preocupações e os problemas dentro das Forças Armadas e recorre a umas “guloseimas” para garantir que não surjam “Salgueiros Maias” por aí. E no final a população em geral, por óbvio desconhecimento, apenas fala para criticar as tais “guloseimas” que o Estado dá.

Façamos um pequeno exercício de memória. As Forças Armadas parece-me ser daqueles casos que passaram de bestiais a bestas com o passar dos anos, sem dúvida que os vários anos de guerra colonial que destruiram imensas vidas, contribuiram para o negativismo em torno delas, mas também é aos militares que devemos o 25 de Abril. Rapidamente voltaram para a penumbra após entregarem o Estado à população, onde a estagnação levou posteriormente ao fim da obrigatoriedade de cumprir serviço e com ele acabou a única coisa que ainda incutia valores como a camaradagem, espirito de corpo e de missão, a correta distinção entre deveres e direitos e por último o sentido de patriotismo.

Estarão a pensar – “Ok, este quer o Serviço Militar Obrigatório de volta.” – Errado. No estado em que as coisas estão, as pessoas não querem mudanças que as obriguem, embora concorde que foi um erro terminar com o Serviço Militar Obrigatório, agora não seria a melhor medida. Tal como se fala que se deve pedir uma reestruturação da divida, também as Forças Armadas necessitam de uma reestruturação e não me estou a referir a reestruturar mudando localizações das unidades militares ou mudar equipamento. Mas sim uma reestruturação da missão das Forças Armadas.

Naturalmente não podemos fugir às obrigações internacionais como cooperações técnico-militares, missões humanitárias e exercícios conjuntos. Mas se a nível internacional a missão está bastante definida, a nível nacional talvez seja necessário esclarecer e aprofundar um pouco mais para que deixe de existir quem ache que as Forças Armadas deviam acabar e para isso é necessário visibilidade.

Se por um lado a dita missão principal é defender a República, por outro existem algumas missões tidas como secundárias, mas bem patentes na Lei Orgânica de Bases da Organização
das Forças Armadas, que nos tempos que correm deveriam ser as mais executadas. Destaco a cooperação com as Forças de Segurança e com a Proteção Civil e em tarefas relacionadas com a satisfação das necessidades básicas e a melhoria da qualidade de vida das populações. É neste plano que as Forças Armadas a meu ver têm participado pouco e o pouco que participam não tem o destaque correto. É necessário que as Forças Armadas, Forças de Segurança, Proteção Civil, Governo e Autarquias, bem como a população em geral deixem de estar fechados sobre si próprios e interajam.

Hoje em dia já vemos alguns casos dessa interação, como os salvamentos em alto mar, onde tipicamente são a Marinha e a Força Aérea com os seus meios que promovem as buscas, o que também se tem visto em épocas de incêndios ou cheias, com a participação do Exército em patrulhas quer para prevenção, quer em rescaldos. Mas temos de elevar isto para um novo patamar.

Como?

Porque não recorrer á Força Aérea para o combate aos incêndios? E se em vez de submarinos tivéssemos investido em aviões ou helicópteros de combate a incêndios que ficassem afetos à Força Aérea que dispõe de pilotos que precisam de fazer horas de voo? Não seria isto um melhor investimento, do que todos os anos a contratar meios aéreos para 3 ou 4 meses?

E as obras públicas?

Existem tantas obras públicas ao nível das autarquias que não são executadas por falta de verbas. Não poderíamos aqui recorrer aos engenheiros e maquinaria existentes no Exército e com isso revitalizar edifícios e estradas? O Exército orgulha-se de ter construído ou reconstruído escolas em missões no estrangeiro. Porque não fazê-lo por cá?

Urgências lotadas? Falta de médicos?

E que tal se estivesse previsto que os médicos militares e as próprias instalações dos hospitais militares pudessem ser utilizadas para este tipo de situações.

São algumas ideias entre muitas outras, mas que permitiriam certamente que a opinião sobre as Forças Armadas melhorasse e consequentemente isso atraísse mais jovens para as fileiras.

Sabendo que as Forças Armadas representam custos ao Estado, parece-me que ainda é possível rentabilizar esses custos mudando a forma de atuar e não apenas através de cortes e congelando carreiras, que para além do efeito negativo que tem diretamente nas famílias afetadas também afeta o consumo por elas feita.

Não podemos cair no facilitismo dos cortes cegos e aumentos vendados. É preciso um esforço enorme e abandonar a nossa zona de conforto para se conseguir sair da melhor forma desta crise e evitar futuras recaídas.

“Treino difícil, combate fácil.”

 

Nuno Rolo

Membro do LIVRE e subscritor da Candidatura Cidadã LIVRE/Tempo de Avançar